Colectânea "Dança de Palavras - palavras em movimento"






eis os dois poemas com que colaborarei na Colectânea "Dança das Palavras - palavras em movimento" 
a convite da Pastelaria Studios Editora







fazer amor com a poesia



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trago as palavras soltas na algibeira e
deixo-as numa confusão de afectos
quando à porta de casa procuro as chaves
.amantes
os poemas esperam-nas e
elas despegadas de qualquer forma
de linguagem
sobem as escadas numa
correria desenfreada
.há um cheiro a Poesia em cada
re.canto como se os lugares sagrados as
tivessem adivinhado antes de tempo
.há um re.acender de corpos quando
se atiram nuas sobre a cama em busca
duma intimidade que só elas conhecem
.e assim tão
irremediavel
mente amadas
ora se apagam ora se acendem
numa intimidade onde
não há espaço para a razão
.ávidas de um momento a sós
com a Poesia
gritam-me
fecham-me a porta e
num êxtase que me exclui
aprontam-se ao ritual dos gestos
num incêndio inverso
à cicuta que os versos
deixaram esquecidos
sobre a cómoda



ser poeta




*
*
falam-me de um outro modo de ser poeta
.não conheço .não quero conhecer amores
perdidos ou proibidos em redondilhas ou
rodriguinhos .limito-me a amar a árvore que
nasceu anã .a palavra que
escorre a contra-gosto pelos meus dedos
.o sorriso do esquecimento que oblitera
o meu país onde a linguagem se perde
em risos intermináveis
.as palavras são estilhaços que deixo colados
aos regaços e com elas
percorro labirintos de tinta nascidos no
meu peito .cinzas que se consomem
à nascença em restos esquálidos
ou tão desabridos quanto o Levante
.é no contraditório que lavo as mãos qual
Pôncio Pilatos de quem herdei a traição
e o rastilho .acendo fósforos que lanço ao
mar e no caos com que agasalho a vida
cravo as unhas nos ramos das árvores
como des.agravos de uma servidão mal
levedada
.uso a caneta apenas para acender o dia 




Gabriela Rocha Martins
,Junho de 2017