Judite

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-pascal renoux.


à Inês Guerreiro Clemente,
24
de Novembro de 2007



Judite tinha 14 anos
todas as manhãs encontrava.a sentada no muro do Liceu como se aguardasse a sua chegada
bom dia ,sotôr
olhos ansiosos e grandes envolviam um sorriso espectador de todas as coisas
que segredos se escondiam naqueles olhos negros!
umas vezes acompanhava.o até à sala dos Professores ,outras ,esperava.o junto à porta do 9º F .falava pouco ,mas ouvia.o ,como se as suas palavras lhe trouxessem ,todo ,o mundo que ia descobrindo para além dos limites da cidade
e todas as manhãs a encontrava sentada no muro do Liceu
era Janeiro
uma chuva miúda batia nas janelas da sala enquanto os alunos desenvolviam a composição – “o que é um professor?”
só Judite ,parada ,com aqueles olhos grandes e negros ,se dividia entre a janela e ele .um sorriso cúmplice bailava.lhe nos lábios quando o fixava
opacidade
sentia.se irritado com o cinzento do céu ,o constante gotejar da chuva ,o adormecer precoce dos dias de Inverno a que o embaciado da respiração deixava ,nas janelas ,a saudade do sol ,dos dias quentes de Verão ,do verde dos campos e ,sobretudo ,de si
não achas que vai sendo tempo de começar a composição?” – creio mesmo que lhe gritou
Judite sobressaltou.se
os seus olhos grandes e negros pediram.lhe para sair
porquê ,Judite?
tentava ainda sorrir.lhe através do silêncio de uma lágrima
ele ,que ,durante meses ,lhe levara ,nas suas palavras ,as cidades e o mundo ,destruíra ,num só momento ,um sonho ,a sua capacidade de criar ,de vestir.se de vento e de chuva
sobre a sua secretária uma folha em branco
na sua frente uma carteira vazia
sem dúvida ,a melhor resposta à sua pergunta

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